junho 30, 2006



Inverno
Isabel Machado

É inverno!
E o meu coração chora tua ausência...
chora, encharca a rua já tão molhada
não brinda mais à lua embriagada
resplandecendo no meu céu anil...
É inverno!
E eu pergunto aos meus pés gelados
inertes, sem calor,
onde ponho a saudade e essa frieza
que só partiam,
quando chegavas como aquecedor...
É inverno!
A escuridão da noite me entristece
padece dentro de mim a nostalgia
toda a melancolia do mundo está aqui...
Mas é mais clara a solidão que chega
me faz companhia
ri do meu frio
e acende o pavio
da tua presença...
E, mansamente, assim...
acende uma fogueira
dentro de mim...

junho 29, 2006



Isolabella
Lya Luft

Quero levar-te àquela ilha
onde serás amado,
onde serás aceito
do jeito
que és.

Onde podes tirar a máscara
e deixar esplender
teu rosto.
Onde minha ternura
não se espantará
com teu grão de loucura;
onde minha paixão não diminuirá
com tua parcela de medos;
onde podes ser o que és,
naturalmente,
e mesmo assim
farei de ti
um rei.

junho 28, 2006



Não te amo como se fosses rosa de sal, topázio
ou seta de cravos que propagam o fogo:
amo-te como se amam certas coisas obscuras,
secretamente, entre a sombra e a alma.
Amo-te como a planta que não floriu e tem
dentro de si, escondida, a luz das flores
e, graças ao teu amor, vive obscuro em meu corpo
o denso aroma que subiu da terra.
Amo-te sem saber como, nem quando, nem onde,
amo-te diretamente sem problemas nem orgulho:
amo-te assim porque não sei amar de outra maneira,
a não ser deste modo em que nem eu sou nem tu és,
tão perto que a tua mão no meu peito é minha,
tão perto que os teus olhos se fecham com meu sono.

(Pablo Neruda)

junho 26, 2006



"Liberdade,
Que pena eu ter meu caminho,
como um rio que corre sem misturar-se,
como uma nuvem que passa sozinha,
como uma estrada que segue sem bifurcar-se.

Que pena eu ser assim: sem afluentes.
Sem parcerias. Sem dono. Sem encruzilhada.
E ter a cara inteira, não metade.
Que pena eu ser total, não ter um trevo;
uma esquina, uma paralela, uma brecha,
um espaço em mim...
que pena eu ser assim: com divisas.
que pena eu ser assim: um sem outro.
Como um único Sol, uma só Lua.
E não como as meias: aos pares."

Glória Horta

junho 23, 2006



Poema Sobre a Recusa
Maria Teresa Horta

Como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
nem na polpa dos meus dedos
se ter formado o afago
sem termos sido a cidade
nem termos rasgado pedras
sem descobrirmos a cor
nem o interior da erva.

Como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
minha raiva de ternura
meu ódio de conhecer-te
minha alegria profunda.

junho 22, 2006


Luzir
Ulisses Tavares

deixar crescer o amor.
olhar o amor que cresce.
pegar então o amor,
esse balão,
subir com ele até
bater a cabeça no céu.
agora, soltar o amor,
deixar subir o amor,
subir sozinho.

junho 21, 2006



Expectativa
Flora Figueiredo

O Vento anda ficando mentiroso:
prometeu trazer você,
não trouxe;
de dizer o por quê, não disse;
esperou que eu me distraisse,
passou com pressa, rumo ao horizonte.
Já não tem importância
que cometa outra vez
um ato de inconstância.
Aprendi a esperar.

Se ventos são capazes de levar embora,
a qualquer hora,
também serão capazes
de fazer voltar.

junho 20, 2006


Contra o tempo
Vander Lee

Corro contra o tempo pra te ver
Eu vivo louco por querer você
Morro de saudade, a culpa é sua

Bares ruas estradas desertos luas
Que atravesso em noites nuas
Só me levam pra onde está você

O vento que sopra meu rosto cega
Só o seu calor me leva
Numa estrela pra lembrança sua

O que sou, onde vou, tudo em vão...
Tempo de silêncio e solidão

O mundo gira sempre em seu sentido
Tem a cor do seu vestido azul
Todo atalho finda em seu sorriso nu

Na madrugada uma balada soul
Um som assim meio que rock in roll
Só me serve pra lembrar você

Qualquer canção que eu faça tem sua cara
Rima rica, jóia rara
Tempestade louca no Saara.

O que sou, onde vou, tudo em vão...
Tempo de silêncio e solidão

junho 19, 2006


Sampa - Avenida Paulista
Homofobia é crime!
Direitos sexuais, são direitos humanos.

Bom pra você
(Zélia Duncan)

Faça o que é bom
Sinta o que é bom
Pense o que é bom
Bom pra você!

Coma o que é bom
Veja o que é bom
Volte ao que é bom
Bom pra você!

Guarda pro final
Aquele sabor genial
Se é genial pra você!
Tente o que é bom
Permita o que é bom
Descubra o que é bom
Bom pra você!

Então beije o que é bom
Mostre o que é bom
Excite o que é bom
Bom pra você!

Um dia você me conta
Um dia você me apronta
Um resumo
Do supra-sumo do seu prazer

Pese o que é bom
Perceba o que é bom
Decida o que é bom
Bom pra você!

(este post é dedicado ao meu grande amigo-irmão Edú, além do Arco-Íris... saudades de ti....)

junho 14, 2006



SAUDADE
(Clarice Lispector)

"Saudade é um pouco como fome.
Só passa quando se come a presença.
Mas às vezes a saudade é tão profunda
que a presença é pouco:
Quer-se absorver a outra pessoa toda.
Essa vontade de um ser o outro
para uma unificação inteira
é um dos sentimentos mais urgentes
que se tem na vida."

junho 13, 2006



Noturno
Henriqueta Lisboa

Meu pensamento em febre
é uma lâmpada acesa
a incendiar a noite.

Meus desejos irrequietos
à hora em que não há socorrro,

dançam livres como libélulas
em redor do fogo.

junho 12, 2006



Segredos
Frejat

Eu procuro um amor
que ainda não encontrei
diferente de todos que amei

Nos seus olhos quero descobrir
uma razão para viver
e as feridas dessa vida
eu quero esquecer

Pode ser que eu a encontre
numa fila de cinema
numa esquina ou numa mesa de bar

Procuro um amor
que seja bom pra mim
vou procurar, eu vou até o fim

E eu vou tratá-la bem
pra que ela não tenha medo
quando começar a conhecer
os meus segredos

Eu procuro um amor
uma razão para viver
e as feridas dessa vida
eu quero esquecer

Pode ser que eu gagueje
sem saber o que falar
mas eu disfarço
e não saio sem ela de lá

Procuro um amor
que seja bom pra mim
vou procurar, eu vou até o fim.

junho 09, 2006



Românticos
Vander Lee

Românticos são poucos
Românticos são loucos desvairados
Que querem ser o outro
Que pensam que o outro é o paraíso.

Românticos são lindos,
Românticos são limpos e pirados
Que choram com baladas,
Que amam sem vergonha e sem juízo

São tipos populares, que vivem pelos bares
E mesmo certos vão pedir perdão
E passam a noite em claro
Conhecem o gosto raro
De amar sem medo de outra desilusão

Romântico é uma espécie em extinção.
Românticos são poucos,
Românticos são loucos,
Como eu
(Como nós).

junho 08, 2006



Fernando Pessoa
Cancioneiro

Contemplo o lago mudo

Contemplo o lago mudo
Que uma brisa estremece.
Não sei se penso em tudo
Ou se tudo me esquece.

O lago nada me diz,
Não sinto a brisa mexê-lo
Não sei se sou feliz
Nem se desejo sê-lo.

Trêmulos vincos risonhos
Na água adormecida.
Por que fiz eu dos sonhos
A minha única vida?

junho 07, 2006



Quando a Chuva Passar
Ramon Cruz

Pra que falar?
Se você não quer me ouvir
Fugir agora não resolve nada
Mas não vou chorar
Se você quiser partir
Às vezes a distância ajuda
E essa tempestade um dia vai acabar
Só quero te lembrar
De quando a gente andava nas estrelas
Nas horas lindas que passamos juntos
A gente só queria amar e amar
E hoje eu tenho certeza
A nossa história não termina agora
Pois essa tempestade um dia vai acabar
Quando a chuva passar
Quando o tempo abrir
Abra a janela e veja: eu sou o sol
Eu sou céu e mar
Eu sou seu e fim
E o meu amor é imensidão.

junho 06, 2006


Escreve-me ...
Florbela Espanca

Escreve-me! Ainda que seja só
Uma palavra, uma palavra apenas,
Suave como o teu nome e casta
Como um perfume casto d'açucenas!

Escreve-me! Há tanto, há tanto tempo
Que te não vejo, amor! Meu coração
Morreu já, e no mundo aos pobres mortos
Ninguem nega uma frase d'oração!

"Amo-te!" Cinco letras pequeninas,
Folhas leves e tenras de boninas,
Um poema d'amor e felicidade!

Não queres mandar-me esta palavra apenas?
Olha, manda então...brandas...serenas...
Cinco pétalas roxas de saudade...

junho 05, 2006



Lua Alta
Ana C. Pozza

Lua alta
E por trás
De tantas nuvens
Brilham estrelas...
Aqui,
Por trás desta neblina,
Brilho também...
Sozinha
E acompanhada
De mim
E de mais ninguém...
Não direi mais nada
É o silêncio que mais convém...
Agradecida,
A LuaSussurra:
Amém...

junho 02, 2006



Minha Maria também chovia
Maria (As Cores de Frida)

Tem horas que viro água.
E eu que já me sabia Maria,
descubro-me agora chuvosíssima.
Tudo em mim escoa
Medos, cansaço, susto
e o que mais da vida for
vira correnteza desesperada,
irrepresável.
Feito um rio que outra coisa não pode ser
além de violentas águas correndo pro mar.

junho 01, 2006



Papoilas
Ana Mafalda Leite

Estou opiada de ti
e percorres-me os nervos todos
com papoilas borboletas vermelhas
o meu corpo entrança-se de sonhos
e sente-se caminhando por dentro
aspiro-te
como se me faltasse o ar
e os perfumes dançam-me
qualquer coisa como uma droga bem forte
corpo e alma
rezam pequenas orações
gestos ritmados ao abraçar-te como que abraça
sonhos
coisa estranha
opiada me preciso ou apenas vestida de papoilas e
muito sol com luas por dentro
para poder mastigar estes sonhos
reais como mandrágoras