novembro 30, 2006
Fogo
Encandescente
Ardem-me no corpo as palavras de amor
Quando não ditas
Quando não escritas
Quando não soltas.
Doem-me no corpo as palavras de amor
Fustigam-me a pele
Como gestos dedos
Querendo ser ditas
Querendo ser escritas
Querendo ser soltas.
Queimam-me o corpo as palavras de amor
Que escrevo na página
Que deito na página
Leito de palavras
Onde me incendeio
Onde em fogo ardo
E em fogo queimo
Palavras de amor
Que ardem em mim.
novembro 29, 2006
Kit
Flora Figueiredo
Trouxe para você
um kit ternura.
Vem composto
de um beijo molhado e aquecido
no ponto ideal.
Para não causar resfriado
nem queimadura de terceiro grau.
Uma mordiscada
para ser usada por perto da nuca,
de preferência sempre perfumada;
um sussurro na orelha,
no lado de trás,
onde o arrepio se satisfaz;
um abraço tão justo, tão justo,
que o coração pode levar um susto
com medo de ser atropelado;
um carinho tão preciso
que lhe faça desvestir o juízo,
e de tal habilidade,
que, a cada recaída minha
de infidelidade,
possa servir como abono.
Um aviso
para ser colado à testa
e em toda fresta que você tiver:
"Tem dono".
novembro 28, 2006
Tudo ou nada
Itamar Assumpção / Alice Ruiz
Come on, Baby
Transformar esse limão em limonada
Passar da solidão pra doce amada
Pegar um trem pra próxima ilusão
Come on, Baby
Segurar esse rojão metade cada
Seguir o coração em disparada
Numa estrada que só tem a contramão
Come on, Baby
Arriscar num passe só de palhaçada
Faz de conta que o que conta conta nada
Apostar na falta de exatidão
Come on, Baby
Repartir toda noite em vários dias
Repetir tudo o que seja alegria
E sonhar na corda bamba da emoção
Come on, Baby
Voar sem avião, sem ter parada
Inverso da razão ou tudo ou nada
Fazer durar a chuva de verão
Come on, Baby
Você e eu, luar, beijos, madrugada
A vida não tá certa nem errada
Aguarda apenas nossa decisão
novembro 23, 2006
Timidez
Cecília Meireles
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...
- mas só esse eu não farei.
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras distantes...
- palavras que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponhos vestidos noturnos,
- que amargamente inventei.
E, enquanto não me descobres,
os mundos vão nevegando
nos ares certos do tempo
até não se sabe quando...
- e um dia me acabarei.
novembro 22, 2006
Corridinho
Adélia Prado
O amor quer abraçar e não pode.
A multidão em volta,
com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.
O amor usa o correio,
o correio trapaceia
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.
O amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.
Fala a palavra açucena,
pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.
Tudo manha, truque, engenho:
é descuidar, o amor te pega,
te come, te molha todo.
mas água o amor não é
novembro 21, 2006
novembro 20, 2006
Dedido esse post a minha filha Juliana !!!
Ju, Feliz Aniversário !
Que todos os seus sonhos sejam realizados !
(é claro que a imagem não poderia ser outra,
afinal, filha de gata, gatinha é ! hehehe)
te amo minha gata !!!
muitos beijinhos no seu coração !
Os Filhos
(Do Livro "Os Profetas")
Gibran Kahlil Gibran
Vossos filhos não são vossos filhos.
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E embora vivam convosco, não vos pertencem.
Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos,
Porque eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Pois suas almas moram na mansão do amanhã,
Que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.
Podeis esforçar-vos por ser como eles,
mas não procureis fazê-los como vós,
Porque a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados.
Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.
O arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com toda a sua força
Para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe.
Que vosso encurvamento na mão do arqueiro seja vossa alegria:
Pois assim como ele ama a flecha que voa,
Ama também o arco que permanece estável.
novembro 17, 2006
Beleza fácil
Zélia Duncan
O mundo é gentil com a beleza
Põe a mesa, arruma a sala
Exala compreensão
Tudo se faz possível
A beleza pode esconder
O mau, o sujo, o desprezível
Que ainda assim só por ser belo
Faz parecer incrível
E o mundo gosta da beleza fácil
Do que é superprático
Banalidade rara
Superfície clara
Do que se vê logo de cara
E nunca se enxerga
novembro 16, 2006
Rústica
Florbela Espanca
Eu q?ria ser camponesa;
Ir esperar-te à tardinha
Quando é doce a Natureza
No silêncio da devesa,
E só voltar à noitinha?
Levar o cântaro à fonte
Deixá-lo devagarinho,
E correndo pela ponte
Que fica detrás do monte
Ir encontrar-te sozinho?
E depois quando o luar
Andasse pelas estradas,
D?olhos cheios do teu olhar
Eu voltaria a sonhar,
P?los caminhos de mãos dadas.
E depois se toda a gente
Perguntasse: ?Que encarnada,
Rapariga! Estás doente??
Eu diria: ?É do poente,
Que assim me fez encarnada!?
E fitando ao longe a ponte,
Com meu olhar cheio do teu,
Diria a sorrir pro monte:
?O cant?ro ficou na fonte
Mas os beijos trouxe-os eu?
novembro 14, 2006
Dor de Cotovelo
Flora Figueiredo
Deve ser tratada com dignidade.
Não é virose,
epidemia de artrose,
nem mesmo falha de envelhecimento.
Independe da idade.
Costuma dar a sensação
de um escuro profundo,
onde a luz não chega,
onde a esperança é cega
e nossa estima é o rodapé do mundo.
Não acredite !
Como esse mal não transmite
nenhum perigo fatal,
pode ser prazeroso o colo de um amigo,
um abraço forte, como abrigo,
uma palavra doce,
um cafuné.
Acima de tudo, que se mantenha a fé,
muito pior do que passar por isso,
é sonegar emoção,
evitar o risco e o compromisso,
esconder-se atrás das grades da razão.
Quem hoje por amor está sofrendo,
só por amar, já merece estar vivendo
novembro 13, 2006
Ninguém pode construir em teu lugar
as pontes que precisarás passar,
para atravessar o rio da vida
- Ninguém, exceto tu, só tu.
Existem, por certo, atalhos sem números,
e pontes, e semideuses que se oferecerão
para levar-te além do rio;
mas isso te custaria a tua própria pessoa;
tu te hipotecarias e te perderias.
Existe no mundo um único caminho
por onde só tu podes passar.
Onde leva?
Não perguntes, segue-o.
(Nietzsche)
novembro 10, 2006
novembro 09, 2006
Vento Novo
Flora Figueiredo
Estava enrolada
em teias e traças,
debaixo da escada,
lá no subsolo
da casa fechada.
Começava a tomar ares de desgraça.
Manchada do tempo,
fenescia
a esperar que um dia
alguma coisa acontecesse.
Antes que se perdesse completamente,
sentiu passar um vento cor-de-rosa.
Toda prosa, espanou a bruma,
pintou os lábios
e sem vergonha nenhuma
caprichou no recorte do decote.
A felicidade volta à praça
cheia de dengo e de graça,
com perfume novo no cangote.
novembro 08, 2006
novembro 07, 2006
novembro 06, 2006
Já és minha
Pablo Neruda
Já és minha. Repousa com teu sonho em meu sonho.
Amor, dor, trabalho, devem dormir agora.
Gira a noite sobre suas invisíves rodas
e junto a mim és pura como ambâr dormido...
Nenhuma mais, amor, dormira com meus sonhos...
Irás, iremos juntos pelas águas do tempo.
Nenhuma viajará pela sombra comigo, só tu.
sempre viva. sempre sol... sempre lua...
Já tuas mãos abriram os punhos delicados
e deixaram cair suaves sinais sem rumo...
teus olhos se fecharam como
duas asas cinzas, enquanto eu sigo a água
que levas e me leva.
A noite... o mundo... o vento enovelam seu destino,
e já não sou sem ti senão apenas teu sonho...